quarta-feira, 14 de novembro de 2018

II Seminário de Humanidade do Ifes Vitória


Na última terça-feira,13, tive a alegria de ministrar o minicurso "Liberdade ou prisão? Jornalismo, Facebook, WhatsApp e a multiplicação das fake news" para os estudantes do Ifes Vitória.

O papo aconteceu como parte do II Seminário de Humanidades, inserido dentro da Semana da Consciência Negra, da Semana do Livro e da Semana de Educação Para a Vida.

Foi bacana demais o encontro com essa moçada, que se mostrou bem crítica em relação aos principais fatores que condicionam a propagação desenfreada de conteúdos fakes na rede.

Todo o debate que desenvolvi no Ifes sobre notícias falsas e redes sociais online rede está dentro de um artigo que, assim que possível, compartilharei aqui no blog.

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Nem tão breve pitaco sobre cinema: Bohemian Rhapsody

A primeira música do Queen que me pegou - ainda moleque e sem manjar nada de inglês - foi "Who wants to live forever" (do álbum "A Kind of Magic", de 1986). Naquele contexto dos 90 em que cresci, só tive contato com a faixa porque ela fazia parte de uma coletânea de trilhas do cinema que ganhei de presente do meu irmão (a composição foi tema do longa Highlander, lançado no mesmo ano que o disco).

Depois do primeiro contato fui me empolgando aos poucos com os clássicos da banda, mas só me tornei fã mesmo muito tarde, duas décadas depois, mais precisamente em 2011, quando por ocasião dos vinte anos sem o Freddie - e do meu trabalho como jornalista nas Gerais - precisei escrever um artigo sobre a história de amor do vocalista com Mary Austin.

Quem me conhece sabe que levo muito a sério cada linha que escrevo e foi justamente por isso que passei dois meses estudando a história do Queen (mais especificamente mergulhado no universo de Mercury) para escrever o texto para o jornal. Foram dois meses acordando e dormindo com as músicas e as histórias da banda na cabeça.

Relendo hoje o texto que publiquei na ocasião, admito que ele não ficou lá grande coisa, embora tenha recebido um elogio ou outro (que agora questiono). Enfim, acho que o texto não pegou, mas a história do Queen, de "desajustados para desajustados", essa sim... essa de alguma forma me pegou ali. E desde então a banda virou uma playlist constante na minha vida para todo e qualquer momento. Acabei me tornando um "fã tardio" e passei a apreciar cada vez mais a diversidade monstruosa das composições e arranjos.

O único problema de ter me tornado esse "fã tardio" é que, como tal, carrego a melancolia trazida pela impossibilidade de conferir todo o "desajuste" do Queen ao vivo e in loco (arrependimento que ficou ainda maior quando perdi o Brian May e Roger Taylor no Rock in Rio, mas isso é outra conversa).

Pois bem, tenho visto muitos críticos reclamarem que o longa Bohemian Rhapsody é uma versão higienista demais da vida do Freddie; ou que é mais sobre o Queen do que sobre o vocalista; ou ainda que é musical demais e abre mão de explorar aspectos da subjetividade de Mercury; ou que comete um “pecado terrível” ao ignorar a infância do pequeno Farrokh Bulsara.

Respeitosamente, discordo disso tudo. Obviamente, o filme faz um recorte, afinal não dá para contemplar todas as expectativas que qualquer produção sobre o Queen nutre (música, biografias complexas, turnês, brigas, a morte de Mercury, a banda sem o vocalista, etc). Primeiro porque não é um documentário, é uma cinebiografia. Segundo porque cinebiografias, via de regra, são recortes realizados a partir de quem as conta (e aí é óbvio que se a narrativa parte dos membros da banda e de  seu antigo empresário, o período de convivência entre seus quatro integrantes e o produtor será realçado). Isso sem contar que o próprio Freddie sempre fez questão de deixar sua infância soterrada nos escombros da própria memória (apenas Mary conhece de fato as dores e os afetos que o líder do Queen cultivou desse período).

Mais especificamente sobre a crítica de ser "higienista" no que diz respeito à sexualidade de Freddie Mercury, eu não poderia discordar mais. O filme trata de forma bastante sensível a figura do cantor enquanto indivíduo queer que carrega consigo o peso da cultura que a família busca preservar e, apesar de todas as contradições que marcam essa existência singular e atormentada, não tenta passar de forma alguma uma visão heteronormativa do astro. Ao contrário, seguindo a cronologia da vida do próprio vocalista, parte do noivado com Mary, mostra a descoberta e explosão de uma sexualidade que estava reprimida e, ao fim, retrata de forma bem sensível a ocasião em que ele decide apresentar Jim Hutton aos pais como um "amigo", reforçando o drama que marcou sua existência. Poderia ter explorado mais os “escândalos” ligados à sexualidade dele? Sim, são opções éticas e estéticas, mas tomar tal caminho, ao meu ver, seria reproduzir três décadas depois a mesma histeria sensacionalista dos tabloides ingleses dos anos 1980, algo que o próprio longa-metragem critica, deixando claro que o Queen (na vida real e no filme) sempre quis falar de música e nada mais.

E é na aposta acertada de focar na música que o longa se torna brilhante e é capaz de levar o público dentro do cinema às lágrimas, seja ele composto por fãs contemporâneos a Mercury ou "tardios", como no meu caso. Ao recriar os vintes minutos do Live Aid (com uma interpretação de arrepiar do ator Rami Malek), Bohemian Rhapsody te faz regressar dentro da sala de cinema a 1985. É como se você entrasse numa máquina do tempo e realizasse o sonho louco de desembarcar naquela que é apontada não apenas como a melhor apresentação do Queen, mas como a melhor apresentação ao vivo de uma banda de todos os tempos. E isso certamente é melhor que qualquer detalhe sensacionalista da biografia de Freddie Mercury. Em outros termos, além de valer o ingresso de um show do Queen (certamente com mais zeros que o bilhete do cinema), essa escolha permite que o filme faça justiça à memória que o líder da banda queria perpetuar, aquilo que segundo as próprias palavras ele nasceu para ser: uma lenda do rock.